O futuro do Empreendedorismo Social no Brasil: tendências e oportunidades para 2025 por: Paulo Schwartzman

 


Em um Brasil calcado pelos desafios estruturais e pelacrescente busca por soluções inovadoras para problemas socioeconômicos, avoluma-se o empreendedorismo social como uma verdadeira força transformadora no Brasil. Diferentementedo modelo tradicional de negócios, no qual o lucro é o principal objetivo, as iniciativas de impacto social buscam equilibrar sustentabilidade financeira e geração de valor real para a sociedade. É nesse contexto que, num país marcado por desigualdades profundas e ineficiências institucionais, o fortalecimento desse setor representa não apenas uma tendência, mas uma necessidade urgente.

 

Diante desse cenário, identificar as principais tendências e oportunidades para o empreendedorismo social em 2025 é um exercício fundamental para direcionar investimentos, políticas públicas e ações estratégicas por parte dos tomadores de decisão. 

 

Minha trajetória como fundador da MP Sports, SoftDent, Arbitrivm e IsaPay me proporcionou uma visão ampla (e mãos na massa)sobre os desafios e as possibilidades do empreendedorismo no Brasil. Cada uma dessas iniciativas, atuando em diferentes segmentos, trouxe aprendizados valiosos sobre inovação, gestão de impacto e superação de barreiras institucionais. Essa experiência prática fundamenta parte da análise apresentada neste artigo, permitindo uma abordagem crítica e aplicada às reais necessidades do ecossistema de negócios sociais.

 

Feita essa introdução passemos àscinco tendências emergentes e cinco oportunidades promissoras que têm o potencial de redefinir o ecossistema de negócios sociais no Brasil, promovendo inclusão, eficiência e inovação:

 

Tendências

 

1 – Empreendedorismo Social Digital

 

A tecnologia tem sido um vetor de transformação em todas as áreas da sociedade e no campo do empreendedorismo social não poderia serdiferente. Ferramentas digitais democratizam o acesso a serviços essenciais, possibilitando que populações historicamente marginalizadas se integrem ao mercado e exerçam sua cidadania de maneira mais ativa e plena. Plataformas de ensino online, aplicativos de inclusão financeira e soluções baseadas em inteligência artificial permitem que empreendedores sociais escalem suas iniciativas com maior eficiência e impacto, superando as tradicionais barreiras de entrada. A despeito disso,o avanço do empreendedorismo social digital também exige um olhar crítico sobre a concentração tecnológica e os desafios da inclusão digital, uma vez que o acesso à internet de qualidade ainda é um privilégio restrito a certas camadas da população.

 

Além disso, há o risco de que soluções digitais, quando mal desenhadas, reforcem desigualdades ao invés de reduzi-las, reproduzindo vieses discriminatórios, por exemplo. Com efeito, ouso de inteligência artificial na concessão de crédito, por exemplo, pode perpetuar tais vieses discriminatórios se os algoritmos forem treinados com dados históricos que refletem desigualdades estruturais. Assim, o desenvolvimento do empreendedorismo social digital exige uma abordagem ética e regulatória cuidadosa, garantindo que essas inovações sirvam de fato para inclusão e não para o aprofundamento de disparidades. O futuro dessa tendência dependerá, portanto, da capacidade de criar um ecossistema digital verdadeiramente acessível, pautado em governança transparente e responsabilidade social.

 

2 – Educação Empreendedora e Inclusiva

 

A formação empreendedora tem sido um elemento central nas discussões sobre desenvolvimento econômico e redução da pobreza. No entanto, o modelo tradicional de educação no Brasil ainda se estrutura em torno de uma concepção linear do conhecimento, atrelada ao que Paulo Freire alertava ser uma “educação bancária”, na qual o processo de ensino se resume basicamente ao professor unilateralmente colocando conhecimento na cabeça dos alunos. Em contraposição, a educação empreendedora e inclusiva, muita mais calcada na ideia freireana de “educação libertadora”,propõe uma ruptura com essa lógica, estimulando a autonomia, a criatividade e o pensamento crítico desde os primeiros anos da escolarização. Ao integrar disciplinas como gestão de projetos, inovação social e sustentabilidade dentro docurrículo escolar, essa abordagem prepara jovens para atuar em um mundo em constante transformação.

 

É forçoso reconhecer, todavia,que a mera inserção do empreendedorismo como disciplina ou conjunto de práticas não é suficiente para garantir um impacto significativo. Se essa tendência não for acompanhada de políticas públicas robustas, que incluam capacitação para professores, infraestrutura adequada e financiamento para iniciativas educacionais inovadoras, corremos o risco de meramente adicionar mais uma disciplina desconectada da realidade aos currículos.

 

3 – Fortalecimento das Fintechs Sociais

 

O sistema financeiro tradicional nunca foi plenamente acessível às camadas mais pobres da população brasileira. Bancos impõem barreiras burocráticas e taxas elevadas que excluem milhões de brasileiros do sistema bancário formal, restringindo seu acesso aocrédito e aosserviços financeiros básicos. Nesse cenário as fintechs sociais emergem como uma solução inovadora para promover inclusão financeira, oferecendo produtos e serviços acessíveis para microempreendedores, trabalhadores informais e comunidades de baixa renda. Ao simplificar o acesso ao crédito e reduzir a intermediação bancária essas startups podem atuar como catalisadoras do desenvolvimento econômico e social, um exemplo de fintech que ajudei a fundar e que pertence a essa linha é justamente a Isapay, empresa calcada na tríade conhecimento-comunidade-crédito e que tem como escopo educar, fortalecer e promover o empreendedorismo feminino periférico.

 

4 – Saúde e Bem-Estar Acessíveis

 

Que adesigualdade no acesso à saúde é um dos maiores desafios do Brasil quase todos já sabem,  enquanto as classes mais privilegiadas usufruem de um sistema privado com tecnologia de ponta, a maior parte da população depende de um sistema público frequentemente sobrecarregado e subfinanciado. Nesse contexto, soluções empreendedoras que promovam saúde e bem-estar acessíveis tornam-se cada vez mais urgentes. A telemedicina, por exemplo, vem se consolidando como uma alternativa viável para ampliar o acesso a consultas e exames, especialmente em regiões periféricas e rurais.

 

No entantoa expansão desse setor não pode ocorrer sem uma reflexão crítica sobre seus limites e desafios. O acesso à tecnologia necessária para usufruir desses serviços continua sendo uma barreira para milhões de brasileiros. A tecnologia pode ser um instrumento poderoso para a democratização da saúde, mas somente se efetivamente puder estar disponível à população em geral.

 

5 – Inclusão Social no Mercado de Trabalho

 

O mercado de trabalho brasileiro é historicamente excludente para determinados grupos, como pessoas com deficiência, negros, mulheres e população LGBTQIA+. Apesar dos avanços nas políticas de diversidade e inclusão, a desigualdade persiste em diversas áreas, desde o acesso a oportunidades até as condições de permanência no emprego. Empresas que adotam programas estruturados de DEI (diversidade, equidade e inclusão) não apenas cumprem um papel social fundamental, mas também ganham competitividade ao promover ambientes mais diversos e inovadores.

 

O desafio, contudo, está em evitar que a inclusão se transforme em mero discurso de marketing. Se feito da forma correta, tais programas de diversidade não precisam ser vistos como regras mínimas, mas sim como fontes de visões distintas de mundo, o que fortalece o poder competitivo da empresa. Logo, ainclusão social no mercado de trabalho exige um compromisso real com transformação, o que inclui a revisão de processos seletivos, o combate à discriminação institucionalizada e a implementação de mecanismos de monitoramento e transparência.

 

Oportunidades

 

1 – Marketplace de Produtos Sustentáveis

 

A criação de um marketplace exclusivo para produtos sustentáveis surge como uma solução para o gargalo de que os canais de distribuição convencionais ainda não oferecem espaço adequado para negócios voltados à sustentabilidade. Dessa forma, o marketplace de produtos sustentáveis pode ser a fonte da prosperidade, aoconectarconsumidores exigentes a empreendedores comprometidos com a produção ética. 

 

No entanto, para que essa iniciativa seja bem-sucedida, é fundamental que o modelo de negócios vá além da mera intermediação de vendas. O marketplace deve oferecer suporte logístico, capacitação para os pequenos produtores e certificações que atestem a qualidade e a autenticidade dos produtos comercializados. Dessa forma o impacto positivo da plataforma se estenderápara além das transações comerciais, fomentando uma cultura de sustentabilidade e inclusão econômica.

 

2 – Plataformas de Microcrédito e Financiamento Coletivo

 

Como dito acima na seção de tendências, as plataformas de microcrédito e financiamento coletivo aparecem como uma alternativa viável para democratizar o acesso a recursos financeiros. A descentralização do crédito, permitindo que investidores diretos financiem iniciativas de alto impacto social, pode ser uma ferramenta poderosa de transformação, bem como uma oportunidade para as empresas que aí investem de cumprirem metas de ESG. 

 

No entanto, para que essas plataformas cumpram efetivamente seu papel, é necessário que sejam acompanhadas de mecanismos de governança que garantam transparência, mitigação de riscos e educação financeira para os beneficiários. Sem essas salvaguardas, o modelo pode acabar replicando os problemas do sistema financeiro tradicional, com altas taxas de inadimplência e exploração de pequenos empreendedores.

 

3 – Negócios Sociais na Saúde Mental

 

A crise de saúde mental tem ganhado proporções alarmantes no Brasil e no mundo, impulsionada por fatores como precarização do trabalho, insegurança econômica e hiperconectividade digital, esta última já pontuada por filósofos, como o sul-coreano Byung Chul Han. O aumento dos casos de ansiedade, depressão e burnout evidencia a necessidade de soluções acessíveis e inovadoras para o bem-estar psicológico da população. No entanto o modelo atual de atendimento à saúde mental ainda é restritivo, baseado ou em consultas privadas com custos elevados ou em um sistema público frequentemente sobrecarregado e com pouca oferta de profissionais especializados.

 

Empreendimentos sociais voltados para a saúde mental podem preencher essa lacuna ao oferecer serviços acessíveis e inovadores, como plataformas de terapia online, programas de bem-estar corporativo e redes de apoio comunitárias. Um exemplo de plataforma que conecta pessoas a profissionais da psicologia com descontos nos preços de suas consultas e abordagem calcada especificamente para esportistas é a MP Sports, empresa que foca na abordagem holística dos atletas e da qual tive o prazer de ser também fundador.

 

4 – Plataformas de Gestão Inteligente para Clínicas Médicas e Odontológicas

 

A ineficiência na gestão de clínicas médicas e odontológicas é um dos maiores desafios do sistema de saúde brasileiro. A sobrecarga dos serviços, aliada à falta de processos otimizados, resulta em desperdício de recursos, longas filas de espera e dificuldades no atendimento aos pacientes. Muitas instituições ainda atuam sem sistema informatizado, recorrendo principalmente ao papel para tarefas muito importantes, como agendamento, inventário e prontuário,o que compromete a qualidade do serviço prestado e aumenta os custos operacionais.

 

O desenvolvimento de plataformas inteligentes de gestão pode revolucionar esse cenário ao oferecer soluções que otimizam o agendamento de consultas, a alocação de profissionais, o controle de estoque de medicamentos e a análise preditiva de demanda por serviços. Além de reduzir desperdícios e melhorar a eficiência, essas tecnologias podem contribuir para um atendimento mais humanizado, garantindo que médicos e outros profissionais de saúde tenham mais tempo para se dedicar ao paciente. A SoftDent é empresa inovadora voltada para trazer essa inovação aos dentistas de todo o Brasil. Inclusive, como benefício, a plataforma possui área gratuita, facilitando a aclimatação daquele profissional que usualmente não está acostumado ainda ao sistema.

 

5 – Plataformas de Mediação e Arbitragem Online

 

O sistema judiciário brasileiro é notoriamente lento e burocrático, acumulando milhões de processos em tramitação. Essa morosidade compromete não apenas o acesso à Justiça, mas também a estabilidade econômica, pois empresas e indivíduos enfrentam dificuldades para resolver disputas de forma ágil e eficiente. A mediação e a arbitragem já se consolidaram como alternativas extrajudiciais viáveis para a resolução de conflitos, mas ainda são pouco acessíveis para grande parte da população, seja por desconhecimento ou pelos custos associados.

 

O desenvolvimento de plataformas digitais especializadas em mediação e arbitragem pode ser uma solução inovadora para desafogar o Judiciário e ampliar o acesso a métodos alternativos de resolução de disputas. Utilizando inteligência artificial para triagem de casos e comunicação estruturada entre as partes, essas plataformas podem acelerar significativamente o processo de negociação e acordos. A Arbitrivm, empresa que fundei ano passado justamente com vistas a melhorar a Justiça no Brasil, está em processo final de criação de algoritmo, permitindo processo arbitral que terminaráo desentendimentocom decisão final em menos de 45 dias corridos, prazo absolutamente inferior ao visto em nossos tribunais pátrios.

 

O futuro do empreendedorismo social no Brasil dependerá da capacidade de inovação e articulação entre diferentes setores da sociedade e empreendedores bem intencionados. As tendências e oportunidades discutidas neste artigo, assim como os exemplos de minhas startups,demonstram o potencial desse segmento para gerar impacto positivo e transformar realidades. 

 

Contudo, para que essas iniciativas alcancem seu pleno desenvolvimento, será essencial investir em políticas públicas, financiamento adequado e na construção de um ecossistema colaborativo. O empreendedorismo social é a prova de que uma pessoa pode ajudar a mudar o mundo para um lugar melhor, não sendoapenas uma resposta aos desafios contemporâneos, mas uma estratégia fundamental para a construção de um país mais justo e igualitário.

 

Previous post ICJ se lança como instituição EAD no Brasil com cursos de mestrado, doutorado e pós-doutorado
Next post Economia do Brasil em 2025: Crescimento Moderado, Desafios Persistentes e Oportunidades Emergentes